segunda-feira, 20 de maio de 2019

Embaralhar

Quando o lado de dentro e o de fora estão misturados, ficamos desprotegidos. Qualquer brisa fere a carne viva que cobre nossos corpos. Saímos da casca com muita dificuldade, ainda estamos exaustos pelo esforço, nosso corpo sente cada brisa como navalha. Os dias vão passando e não sabemos se em algum momento a dor termina. Continuamos assim o caminho. Quando olho para o lado vejo que estou só, mas ao fechar os olhos sinto que há tantos comigo. Seguramos nossas mãos e seguimos, um passo de cada vez, todos ao mesmo tempo.

O tempo não faz sentido para nós. Vivemos o passado e o futuro simultaneamente. Agarro o destino pelos cabelos e berro na expectativa de que alguém escute. Ele espreme os olhos, como se isso fosse diminuir a dor. Minha voz rouca rompe seus tímpanos frágeis. Ele continua traçando as linhas da vida, ignora meu desespero. Minha pele ainda dói.

Espero do lado de fora, a casa está vazia, ainda assim não ouso entrar. Ela é conhecida, mas pequena para mim. Encolho as pernas na tentativa de escapar da chuva. A água cai cada vez com maior força, a brisa virou vendaval. Engulo cada lágrima como se fosse veneno. Um pequeno caracol sobe pela parede, observo seu trajeto por alguns minutos. O tempo muda.

Mesmo que pudesse dizer alguma coisa, creio que não falaria. Não há mais palavras. Minha cabeça vazia rola morro abaixo. Fico vendo quicar a cada pedra que passa. Logo me jogo também, sigo seu percurso até nos encontrarmos no mar. Quando já estamos totalmente integradas e a dor já passou, percebo que é hora de partir novamente. Logo o dentro estará fora novamente em um caminho inteiramente novo. Não é possível repetir as ações do passado, nem prever as do futuro. Logo tudo se inverte novamente, mas de forma inteiramente diferente. Em breve essa casa também não servirá mais.

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