quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Desculpe me demorar tanto, tentei segurar o tempo nas minhas mãos e ele escorreu, deixe que voe livre então. Vá com o vento, sou uma folha livre que rodopia como se não fosse mais parar.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Tem alguém aí?

Nos últimos dias o que me assusta não é doer tanto, será isso real? Hei, tem alguém aí do outro lado, isso é real? Você aí, dê sinal de fumaça! Tem alguém aí, tem algo que escorra dentro de você? Quem é você? O que é você, se é que você é você mesmo. Você é o que aparece? Onde está sua face, cadê sua outra face, cadê sua face intermediaria que esconde todas as outras faces? Onde está seu eu que não o burro falante? Onde você largou o seu lado de dentro que se perdeu do lado de fora. Tem alguém aí? Responda. Acho que estou completamente só falando para uma parede invisível onde todas as palavras batem e escorrem letra por letra. Você está aí? Viu o que aconteceu? Conte-me, diga a verdade. Segure minha mão e me leve daqui, o rio secou. Espero que tenha alguém aí, ou será que a liberdade consiste em acreditar que ninguém ouve do outro lado? Você viu? Você viu que eu não pude mais, que não tinha mais o que eu pudesse fazer, você sabe que não fui má por lutar? Você sabe que não foi uma escolha idiota, uma opção egoísta, um chute na boca do estômago? Foi sim um chute de mim para mim mesma. Veja só que maravilha, você ainda está aí? Não feche ainda, não me deixe aqui sozinha, não agora. Preciso de você, ainda está aí?
Eu corri por aqueles campos nublados, esta manhã sentei na janela do sétimo andar e balancei minhas pernas do lado de fora, a cidade é grande e cheia de prédios, a chuva lavou e sujou, se misturou à água da piscina. Eu não pulei, apenas escorreguei um pouco para frente e escorri pelo ar. Desculpa, eu não quis bater com a cabeça contra a parede tantas vezes. Mas é por isso que você ainda está aqui, você... ainda está, não está? É por isso que ainda está, porque eu continuei batendo minha cabeça contra a parede, só assim você teve o que ver. E você achou divertido ver o sangue escorrer, tudo bem, você não sabia que era isso que estava acontecendo. Não vai agora, por favor, fique mais um pouco. Eu não quis ser má. Mas eu fui? Posso até ter sido, quem sabe, tudo depende de como olhamos. Não há um ser mau, mas há quem nos magoe profundamente. Eu magoei você? Não há o que perdoar, não é? O perdão já veio embutido nessa volta. Gostou do passeio? Por onde fomos nesses últimos meses? Que lugares visitamos sem nem nos darmos conta de que estávamos indo. Obrigada, obrigada por me fazer companhia por tanto tempo. Continue por favor, eu não vou desistir. Você vai? Não desista, não estou falando de mim, falo de você é claro. A única coisa da qual não deve desistir, a única coisa pela qual deve lutar, pois é o único que certamente ainda estará a seu lado. Não importa. Eu não pulei, eu escorreguei. Você está certo, não tentei segurar, e isso é um erro?
Por acaso o erro existe? Erros não existem, existem resultados fora do esperado. Por que você esperou então? Por que eu mesma esperei? Estávamos esperando um pelo outro, não, você não estava esperando por mim não é? Só vem me visitar às vezes. Essa é a primeira vez que você me visita? Desculpe a confusão, esse é um período em que nada é, nada está, tudo pode ser, e não se sabe como ficará. Saiba que não me sinto mal por você, o problema é o que sinto mesmo. Eu não sou egoísta, é que não sei quem você é, me importar com o possível desconforto de um desconhecido diante do meu afogamento poderia ser um erro. Você não sabia? Não, não foi a enchente, me afoguei foi com o ar. Sim, ar em grande quantidade, e logo sufoquei. Você ainda está aí? Eu avisei, não avisei? Continuaria morrendo ainda por um tempo. Estou feliz agora, estou feliz porque você está aqui comigo. Sim, eu estava agonizando até... até agora, até você vir aqui comigo. Até você segurar a minha mão. Obrigada, obrigada por caminhar comigo. Obrigada por segurar o galho da árvore para que eu pudesse me servir de fruta fresca. Eu sei, ele mentiu. Tudo bem, nós perdoamos, não perdoamos? Não berre desta forma! Sabe que é feio ser histérico, desculpe, não direi que perdeu a compostura pois nunca teve. Você viu? Viu o que estão fazendo, matam-se e querem que eu seja cúmplice disso!
Basta, não basta? Chega de tantas voltas estranhas não é? Não, não é. Estou nesse redemoinho que não se sabe aonde vai. Você ainda está aí? Não leu os últimos livros que li, não é? E como posso culpar você? Não posso. Sabe, encontrei um livro que me descrevia. Não pude acabar de ler ainda, mas era eu que estava lá, e senti que gostaria de ter sido eu a escreve-lo, mas não fui. Não me sinto triste por isso, sinto-me grata por alguém ter me escrito sem nunca saber quem sou. Clarice, é assim perder o terceiro pé? Como fico se eu puder andar agora. Como faço se quero ter a coragem de deixar moldar sendo que tenho urgência? Você ainda está aí? Não vá, ta bom? Tem alguém aí? Diga se você está aí, estou com medo de ver minhas palavras escorrendo letra por letra nessa parede invisível. Porque se tudo que esteve até aqui escorrer assim, não serão apenas essas coisas, serei eu escorrendo. Serei eu me desmanchando e me perdendo. Eu terei perdido a razão de ser. Terei me perdido de mim mesma. Tem alguém aí? Diga se você me vê, porque eu não posso fazê-lo. Estou cega, o sol de hoje entrou nos meus olhos. Não me joguei, empurrei minha bunda para a frente. Volta. Desculpe, não quero ser chata, mas não quero deixar de ser o que quer que seja. Ouve, o que traz o vento? Ele diz que chegou a hora?
Foi o vento, ele me chamou para escorrer com ele, até chegar aos ouvidos de quem quer que seja. Sente? Estou queimando. Segura minha mão quando pudermos voltar, precisarei de uma mão. Ainda estará aqui? Você viu como ele partiu mil vezes? Viu como ele se jogou a qualquer coisa como se pouco importasse? Viu que tudo o que disse ser meu não era de fato? Viu como as palavras são leves e voam sem nem mesmo precisar de vento? Estou cansada de flutuar dessa maneira, com esse rabo que me prende, que controla minhas manobras, que não permite que eu vá além, que me desvia dos galhos das árvores. É assim que vive a pipa, ela pode voar mas com uma condição. Só que ele já partiu, prendeu meu fio em uma pedra e foi embora para garantir que eu ainda estivesse ali quando voltasse. Brigou com quem ousou se aproximar empunhando uma tesoura. É assim que as coisas deveriam ter sido? É sob as pedras que nos escondemos? Ou escalamos elas para que possamos ver de outro ponto? Na tentativa de resolver as coisas acabamos nos precipitando. Como posso apenas flutuar sem nunca escolher meu rumo?
Eu vi uma pipa laranja num céu azul bem clarinho, um menino segurava seu fio correndo por um grande gramado bem verde. O céu iluminava tudo, mormaço do meio de tarde. Ele correu muito até chegar a beira de um rio muito limpo, deitou sob as árvores e ficou ouvindo o som da água escorrer nas pedras. Dentro desse rio tinha peixinhos multicoloridos e brilhantes. O menino dormiu e sonhou com seus castelos subaquáticos e suas histórias sobre pescadores. E o que aconteceu com a pipa enquanto ele dormia? Poucos sabem, mas era ela quem contava as histórias que o fizeram adormecer. Mas ninguém lembrou de agradecer apropriadamente, e isso também não era um problema para ela. Será que não era mesmo um problema para ela? Essa é a história, você segurou a minha mão por tanto temo, achei que era hora de contar. É essa a história dessa pipa no ar, dessa pipa flutuando sem saber exatamente o que é, para onde vai, sem saber quando será solta, e se for para onde o vento a levará. Pequenos retalhos seus espalhado por aí sem que ela nunca fique sabendo. Eu vinha na carona dessa pipa, mas não será agora a hora de escolher meu próprio rumo? Desculpe a desordem, a confusão das palavras. será possível? Onde você está? Por que está aqui comigo agora?
Você está aqui comigo mas está aí do outro lado. Serei eu então uma iludida. Eu me iludo com sua falsa companhia ou me iludo com sua falsa ausência. Ou você está exatamente aqui mesmo estando ausente. Essa teia mundial que nos liga, nos aproxima e nos afasta. Por que você não vem aqui? Por que você não diz também o que pensa? Por que você olha e parte? Você realmente existe, você está aí mesmo? Eu estou aqui, estou inteiramente aqui, estou despejando coisas que eram só minhas para que pudessem ser suas também. Para que pudéssemos compartilhar. Isso tudo aqui é meu. Mesmo depois de ter sido invadida, mesmo depois de terem invadido meu esconderijo secreto, minha casa na árvore. E mesmo que depois de tudo isso ainda tenham mentido para mim e dito que não devia me zangar pois não foi por mal. Desculpe, mas eu me zanguei, eu me senti profundamente triste, eu perdi o abrigo e a noite estava fria. Você ainda está aí? Então preste atenção, pois fui como o exército lutando contra a guerrilha, foi isso que me aconteceu. Eu nunca quis que isso fosse uma guerra, nunca quis o mau para ninguém, mas me envolveram nisso, e do outro lado estava mentira e falsidade, falsa fraqueza, falsa meiguice, um pobre de mim exagerado, a conquista pela pena. A guerrilha fez de mim exército, e eu deixei que fizessem isso comigo. Eu não preciso de perdão, só quero saber se você está aí. Porque do lado de cá as coisas estão confusas, eu não tenho ideia do que esteja acontecendo.
Minha luta agora não tem inimigo que não seja eu mesma, e meu aliado é você aí do outro lado. Você existe? Ainda está aí? Saiba que dói deixar o que desejo em nome do que acho certo. Não quis bater minha cabeça tantas vezes contra a parede, o sangue coagula e volta a escorrer. Eu não quis me jogar, eu escorri. Desculpe me demorar tanto, espero que você ainda esteja aí. Você está aí? Tem um pássaro voando nessa direção, não sei o que vai acontecer. Quem é você aí do outro lado? Onde vou aterrissar? Que janela estúpida, não vejo nada além do seu vidro. Mostra-me o que quero ver mas não onde você se esconde, e então como saberei se há alguém aí? E de que me adianta se não sei o que quero ver? Afinal quem sou eu?

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Pouco me imoprta a beleza

Hoje a parte minha que fala é a que sente os tapas do mundo. Chegou minha hora de partir, serei outra ave em outro céu. Dia 20 quis escrever que ficaria um tempo em silêncio pois meu abrigo havia sido invadido, mas eu não tinha noção do quanto essa afirmativa era verdadeira. Não escrevi tamanha era a necessidade de me calar. A minha luz foi uma velha amiga que encontrei, mas ela me pareceu tão nova de repente. Deixarei que ela fale por mim por alguns dias, espero ter coragem de segurar em sua mão e aprender com seus passos.
Quando vi estava me sentindo vulgar em meus propósitos, antes eram tão meus, passaram a ser qualquer coisa. Mas parando para pensar pude perceber que eu estava apenas olhando na direção errada, que foi essa invasão que tornou ordinário o que era um abrigo antibombas. Ridiculo que eu me prenda a quem não se importa com o que há de mais básico para mim. Descobri que amor não é suficiente, precisamos de mais do que isso, precisamos de ação. Eu descobri que de todas as coisas que amo, estava agindo pelas erradas. Estava agindo pelo que não age por mim. E é tão estranho descobrir isso pela milesima vez de forma tão diferente. E parece que mais uma vez voltarei atrás, que mais uma vez serei fraca de mais para ir adiante. Mas serei mesmo? Foco, mil vezes foco. Me afogo tentando salvar a todos, foco. E querem saber: muito obrigada, me afoguei! Morri em meio a uma correntesa daquelas que não viamos a tempos. Ontem vi a cidade alagar do alto do predio, mas é chegada a hora de misturar-me a chuva. Muito obrigada, me afoguei! Morri, você me matou lentamente, e doeu apertado de mil formas diferentes, e quer saber: muito obrigada, ainda doi! E que doa, que doa mais mil vezes, mas que doa em outras partes, com outras pessoas, com outras histórias, que eu morra mais um milhão de vezes, mas de formas diferentes. E que eu renasça mais quantas vezes for preciso.
Obrigada, continuarei morrendo lentamente por quanto tempo for necessário, por horas, por meses ou anos. Mas já me sinto renascer em meio as cinzas ainda quentes, nem sei se elas esfriarão, pois estou virando fogo. Basta de apenas flutuar com o vento, vou testar queimar com o vento. É bom que eu registre tudo para mim mesma, é bom que amanhã eu ainda lembre o que pretendo, é bom que eu fique com uma grande cicatriz na face para que possa me lembrar. Minhas asas estão um pouco destruidas, precisarei andar algum tempo por terra.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Uma tecla e fico pendurada entre a indiferença e a aprovação. Seguro em um pedacinho de papel para voar quilômetros. Roubo a atenção que nunca tive, sem nunca ter o que mais quero. Uma fábrica, caixas de papelão sobre a esteira contínua. Para nascer uma coisa nova algo tem que morrer. Me apagar para comprovar a importância que eu não tenho, ou seria para esquecer a importância que tenho? Mas se é para esquecer o que sou, é porque tem menos valor ou porque de tanto valor que tem não precisa ser lembrado? Um recado perdido em um arquivo velho representa o que exatamente. Quando o mar recuou foi para voltar enorme e forte. Tentei me afogar para que não precisasse mais usar a tecla que me deleta, mas deixar de existir não é tão fácil assim. Ouvi um choro de criança sair de uma caixa, chorava de forma tão bela que resolvi não interromper seu lamento. Sentei em um banco de praça e comi sanduíche. Depois da chuva as árvores estavam mais verdes e o céu mais cinza. A água molhou os amantes, pensei em pegar o ônibus para Saturno. Mas o ponto final não costuma ser um ponto final.

Tinha uma represa, daquelas grandes e fortes, muito concreto, impermeável. Só que um dia surgiu uma rachadura, bem no meio. Bom, foi a partir desse dia que começou a vazar, no início parecia que o concreto tinha começado a suar, mas o negócio foi aumentando suas proporções. Todas as noites dormimos ouvindo os estalos sem nunca saber quando tudo viria abaixo. Não preciso falar do que se sente quando sabe que a qualquer instante você pode sufocar. De vítima e predador todos têm um pouco, não adianta ruminar as histórias que na realidade já acabaram. As aparências é que corroem o ser por dentro, ignorar os fatos prolonga a dor. Mas fugir do que pode vir a ser é como fazer um aborto antes da fecundação. Um dia inteiro para descobrir que ainda não acordei, e que a grande barreira de concreto ainda estala em meus ouvidos.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Um gosto quente saía como febre e me envolveu durante o sono. As novidades que por horas já são velhas conhecidas, os amigos se transformam sem prévio aviso. Queria dizer que bebi daquele liquido sem arrependimento, mas sempre que volto a estar no mundo me pergunto o que fazia eu em outra camada do espaço onde nos diferenciamos do que somos quando as luzes estão acesas. Não sei mais bem o porque dessas tardes firas, não sei porque falei tal falsa verdade em alto em bom som, enquanto algumas realidades brotaram em sussurro. E é quando as luzes se apagam e as lágrimas escorrem inaudíveis que percebemos como já não sabemos mais. Mas também as coisas que sabemos ficam tão bem guardadas que às vezes já nem importa de que lado estão. Quando meus lados começam a correr em direções opostas e ainda assim se encontram em algum ponto, eu sinto uma saudade indefinida, e quando esse peito encontra o que procurava ainda há um universo entre os dois. E como cabe tanta distância no espaço de um nada. Como entram tantas vidas em uma inspiração e como as palavras entalam no caminho entre a língua e o ar. Como posso estar completamente nu sem nunca tirar os sapatos e tocar o chão. E depois de anos parece que volto ao meu ponto zero sem recomeçar. A hora de mudar passou e agora não sei se crio uma nova hora ou se parto para onde existam outras horas diferentes das daqui. A busca louca pela verdade às vezes nos faz encontrar nossas próprias mentiras, sem perceber que elas são um refúgio para o nosso medo de saber o que realmente desejamos, e abandonamos o que mais queremos pois a felicidade pode ser muito mais assustadora do que a dor. Porque teríamos que trocar um velho amigo conhecido por uma novidade que quando acabar. Abandonar essa velha indiferença diante de nós mesmos em prol de uma alegria pode levar a algo tão fora do nosso controle quanto uma queda livre segurando apenas uma mão. E se estivermos livres em nossa alegria poderemos não saber o que fazer com ela, e poderemos querer fugir antes que ela acabe, e para isso talvez criemos algumas falhas. Mas se não abandonarmos o medo do que vem na próxima curva, nunca poderemos aproveitar o caminho.

domingo, 16 de janeiro de 2011

Sol, árvores, animais pequenos, médios e grandes, quatro patas, duas patas, asas. Os mesmos caminhos são percorridos de formas diferentes, nossos olhos mudam. E agora parado do lado de cá nos vejo passar na margem oposta. Vento nos cabelos, freios soltos. Sabia que amanhã existia, o que não era um problema. Mas hoje já houve amanhãs demais, alguém tentou puxar o freio e quase batemos com o nariz no chão. Uma lagarta sorridente saiu da terra e subiu na ponta do meu nariz, espirrei com tanta força que ela foi longe. Choveu do outro lado, aqui aproveitamos o sol, garoa fina. Risos, corrida na grama, está com você! Se ainda tem a chave abra a porta e deixe o ar sair.

sábado, 15 de janeiro de 2011

Às vezes olho para as palavras e me pergunto o que elas querem dizer. Pouco, muito pouco, se ficam guardadas por muito tempo, elas podem murchar.

Talvez devesse me calar.

Fico por aqui entre amigos onde eu não me deleto. Não me deleto? Me apaguei tantas vezes para renascer em um novo parágrafo, às vezes volto tentando me rastrear entre borrões, meus vestígios se confundem. Velhas flores apodrecem em vasos de cristal. Seus longos caules foram sendo cortados ao longo do tempo e antes que elas vissem suas pétalas já boiavam na água que bebem. Relembram velhas aulas de botânica, sua jardinagem foi posta de lado. Foram carregadas dentro de um chapéu de palha, serviram penteados, até o seu destino atual derramando pétalas em solo infértil.

Talvez devessemos nos calar. Largar essa sala mofada e partir para o ar livre. Acontece que a estrada logo se bifurca, cada bifurcação tem outras tantas e nós somos acomodados demais. Larga o pé da mesa, ela está tomada por cupins.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

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terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Fenix, salamandras no bico.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Depois de tanta tempestade sentou diante da tela vazia. Parecia estar vendo seu próprio reflexo. O rosto inchado, os olhos vermelhos até as bochechas, sua face escorrida, as pálpebras pesadas, areia nos olhos, os brilhos das gotas presas nos cílios contornando a visão. Pelo menos brilhava. Fazia lembrar da bolinha de vidro, era como se tivesse várias no olhar. O ar morno da rua entra pela janela semiaberta, o gosto de ranho desce pela garganta, a língua pegajosa parece não querer desgrudar, e assim não se pode falar. O choro escorre pelos dentes e vai sempre acabar no estômago, ele pede para ser digerido. Mas é dos alimentos que mais demoram para digerir, é pesado, cheio de sabores que se revelam durante o dia. E a noite parece que eles mudam de forma, eles aumentam, eles tomam conta. Mas ao anoitecer pouco importa, já basta a luz do sol indo se deitar, essa luz semiqualquercoisa, que fala de um estado de deixar de ser e ainda não ser, que fala da passagem do dia para a noite, que vai amortecendo os sentidos, que vai potencializando os amores, que enfia o dedo nas feridas. Ao entardecer pouco importa, a luz já basta, a luz do dia que parte já é suficiente para potencializar as melancolias, para elevar qualquer dor. Nem faz diferença para onde se vai nesse horário, ele escoa por conta própria, escorre por entre os dedos que tentam capta-lo. E ele é tão rápido quanto interminável. Ele é praticamente sempre silêncio e se não for silêncio não se vê. E nesse horário o gosto nos lábios são cores. Se as core murcham resta o ar que respiro nesse horário, e fica indefinido por horas.

Nessa hora também os seres alados começam a sair da toca, voam e tomam conta do espaço. Escondem-se entre as gramas, rondam os corpos, sugam os sangues, iluminam entre as árvores. Nesse horário muitos seres saem das tocas, os povos noturnos vão para seus rituais estranhos, usar roupas desconfortáveis e ouvir sons altos. As pessoas sentam ao ar livre para beber coisas que não gostam e falar com pessoas com quem não se importam. Nesse horário uns se desconectam e outros se conectam. Faíscas são faíscas e os ninhos são mais quentes. O anoitecer anoitece de tantas formas diversas no mesmo dia. No dia seguinte ele nunca é o mesmo do anterior, e no decorrer dos anos ele é sempre novo. Nós nos repetimos, e não importa por quantos anos, sempre anoitecemos diferente. E isso me alegra, pois sei que amanhã não anoitecerei como anoiteço hoje. Embora sempre exista algum anoitecer que poderia ser eterno, ele já passou, mas certamente haverá algum semelhante em sentido.

sábado, 8 de janeiro de 2011

Longas histórias se espalharam pelo chão sem pressa de secar. Quando pude por fim ouvir meu próprio sussurro perguntei-me de onde vinha. As forças depois que abandonam o corpo parecem ter sido tão fáceis, mas quem viveu sabe como foi difícil suporta-las por tanto tempo. As vidas são rios que correm desapegadas do tempo cronometrado, mas quando consultamos as velhas páginas de um novo diário, percebemos que o tempo foi longo, e que não devemos mais procurar forças para nos mantermos na luta, pois a luta já não é mais nossa. Nunca foi uma batalha contra alguém, contra um oponente humano que tenta nos vencer. É sempre a favor de algo, mas de repente percebemos que talvez ele nunca tenha existido, ou já morreu há tempo. E quando percebemos o tempo que já decorreu, o quando as páginas já ficaram sujas e amassadas, e como já fomos mal tratados, resolvo que não quero mais ficar em silêncio para que ninguém perceba que estou ali, não quero mais chegar um pouco antes ou sair um pouco depois. E não podemos dizer que desisti ou fraquejei. Podemos dizer apenas que fui até onde pude, pois desse ponto em diante eu teria que deixar de me amar, e quem não se ama não pode amar mais coisa alguma, sem amor eu não posso produzir, sem produzir não respiro, sem respirar não vivo e sem viver não sonho e sem sonhos todo o resto passa sem cores.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Essa noite a chuva caiu dentro dela. Um raio atingiu certeiro seu peito, um trovão ensurdecedor. O pequeno poste do outro lado da quadra aumentou a solidão da noite. Correu para a rua para que seus lados se misturassem e ela pudesse ser uma só. Correu, a água bate em seus olhos e dificulta a visão, fecha os olhos e deixa que escorra tudo em si. Abraça a criança que lhe pertence e pede abrigo há dias. De joelhos ela nina sua menina, seu doce olhar para o vazio espanta os que passam. Seus braços ainda seguram aquele pequeno nada, enquanto ela vaza sem saber por onde começar. Encharcada pelo banho gelado da noite tenta não voltar. Em meio ao caos era silêncio, olhou para o alto e viu as águias que a rondavam. Suas longas asas batiam uma vez, depois se alongavam e plainavam fluidas. Ergueu os braços pedindo que alguma delas lhe desse carona, não sabe ainda se quer voar sozinha.

Sentou na poltrona estofada, cotovelos nos joelhos. Abriu a mão lentamente, e deixou que escorresse pelos dedos a bolinha de vidro que acertou o chão de madeira com um baque, e rolou fazendo com que a luz refletisse nas superfícies. Sabia que não era mais tempo de espera, mas ainda não inventou um novo caminho por onde ir. Suas roupas ainda pingando, o fogo forte aquecia sua face. Sentiu-se quente como quem tem febre, tremeu com o fogo. A luz amarela das chamas tomou conta dos seus olhos ressecados. Convulsões lhe tiraram o ar, vertia inexplicavelmente, devia ser a chuva querendo sair. Escapava por todos os seus poros, ela vazava descontroladamente. Sabia que aquele fogo não era suficiente para apaga-la. E nós bem que quisemos partir em seu socorro, não nos julgue precipitadamente, não pudemos fazer nada. Já era tarde, ela já estava tomada, completamente tomada, agora tinha que desintoxicar. Precisava passar pelo seu período de abstinência, precisava se livrar dos últimos vestígios que aquela história deixou nela. Nós não tivemos pena, isso nem ela mesma sentia por si. Não sabemos exatamente o que ela sentia, parece que não sentia, ela apenas vertia, era a chuva saindo.

Quando a noite virou dia e a terra voltou a ficar quente, seus olhos arderam como se dissessem: não esqueça, não esqueça. Ela pretendia não esquecer, e também não lembrar. Tem coisas que devem ficar registradas, mas não devemos pensar nelas com muita frequência, ou com nenhuma frequência. Ela resolveu deixar aquela lembrança de lado, embora lembrasse a todo instante. Quando erguia os braços ainda podia sentir a chuva fazendo-a escorrer, quando fechava os olhos ainda via o brilho da bolinha, seu som ainda estava nos ouvidos. Ela se calou para sempre, por um tempo. Vários trens passaram, ela não sabia qual estação era a sua. Mas não queria mais ter pressa, sabe que na sua estação as flores sempre florescem.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Senta Fala fala Pouco houve Sempre chove Pouco move Sempre morre Mas também renasce. sobe Sobe mais Cai Eternamente MentE. rompe Cai Circula Cascata Enxurrada Maria João Porão. porta Chave Guarda chuva Repente Rebenta CorrentE. corre corre corre Cai corre corre Repete corre corre Pula corre corre Sobe corre corre Sabe? corre corre Aspas corre corre! corre corre... Repete Cala. cola vencidA Vacina AntiFurto Furo lateral. conquista para logo perder Ritmo perde para logo conquistar Espera para, logo perde Conquista logo para Perde para logo.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Repete, repete, repete

Acorda, veste roupa, escova os dentes, come, escova os dentes, anda, senta, come, escova os dentes, estuda, come, escova os dentes, anda, sorri, se irrita, come, escova os dentes, sobe, desce, trabalha, come, escova os dentes, deita, dorme. Levanta, corre, lava, come, escova, cai, levanta, espera, come, escova, suspeita, descobre, come, escova os dentes, deita, não dorme. Acorda, não levanta, vira, revira, banhos, escova, comida, corrida, parada, come, escova os dentes, levanta, estende, pendura, pintura, escultura, híbrido, come, não escova os dentes, ajuda, ajuda, atrapalho, esbarro, brinca, brinda, escova os dentes, quase dorme. Levanta, chuveiro, roupas, sapatos, amarras, desamarras, sobe, sobe mais, rompe, cola, gruda, prega, pendura, come, escova os dentes, vira, desvira, mostra, encanta, se desencanta, reencanta, estima, subestima, superestima, come, escova os dentes, pouco dorme, sonha. Sonha, sonha que vive, vive sonhando, sonha vivendo, vende sonhos, compra sonhos, troca sonhos, come sonhos, bebe sonhos, vomita sonhos, escova os dentes, sonha, peçonha, risonha, quase acorda, às vezes dorme, quase nunca acorda. Borda, costura, margem, centro, conquista, larga, voa, acorda, não dormia. Levanta, bate a poeira, chuveiro, roupas, sapatos, continua nu, por baixo dos panos, rua, rodas, cascos, sapatos, chinelos, sinal, aberto, fechado, troca, troco, soma, subtrai, abstrai, esmola, esfola, levanta, sacode, rompe, conquista, guarda, esconde, apresenta, elogio, conquista, novo, velho, refaz, desfaz, pele, cheiro, cabelos, carecas, sol, nuvem, chuva, sol. Dispara, voa para longe, recomeça. Circula, circula, circula, pula, foge, vai adiante.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Depois de tudo, restou apenas hoje.

sábado, 1 de janeiro de 2011

E o dia acordou com vontade de voltar para a cama.