sábado, 3 de abril de 2010

Essa noite os fantasmas, todos, me cercam, eles estão do outro lado da porta, em baixo da cama. A luz faz arder meus olhos cansados. Eu me refugiaria em qualquer lembrança. Mas elas foram levadas, lembra? Eu tento, mas não consigo encontrar uma que me ajude, então me escondo aqui nestas páginas em branco. Este é o meu barco.

Está na hora de criar novas lembranças, estou trabalhando nisso, mas as que perdi me consomem em certos momentos de silêncio. E eu não sei o que vem na escuridão aqui ao lado. Perdi meu batom, espero ainda ter alguns lenços. A meia noite já se foi e com ela a dor no peito. E agora as sombras são mais reais do que os objetos. Elas são só o que existe, sem os objetos que as produzem, e os grilos preenchem a noite.

Lenço florido, cortinas brancas, tinas de águas coloridas. Ando por entre essas bacias brancas onde a luz é refletida. Estou tingida por seus reflexos, sou furta cor. Corro, meus cabelos ondulam com o vento, minha saia corre na direção contrária, sapatos velozes vão a frente. E na frente há uma parede e não transponho, me choco com ela, caio sentada e olho para o paredão infinito. Onde estarei eu agora sentada entre tigelas multicoloridas?

Pego meu bloquinho de notas no bolso, uma caneta e anoto, anoto tudo que se passa para que não se perca, caso eu esqueça. E quem sabe assim apareça uma praça, banco de madeira arredondado. Apoio a testa na mão, e vejo se alguém atesta. Atestado correndo pela grama, tigelas coloridas. Entre as árvores, prismas pendurados nos galhos. Borboletas sorridentes, sento em um gazebo. Observo o mundo lá fora. Vou ao jardim botânico, entro em pânico. Só mantém a calma quem tem porque perde-la.

Só a turbulência pode trazer a paz de volta, só o cobertor pode espantar os fantasmas, agora. Vou mudar meu esconderijo e pedir para que os mosquitos não me denunciem.

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