sábado, 21 de abril de 2012

Sobre um dia prata

Em uma ruazinha estreita passeava um caminhão carregado de madeiras. Eu poderia ter passado por baixo ou pelo lado, mas foi por cima que o caminho me pareceu mais animado. Tem dias nos quais nem sei o que dizer, mas quase nunca acordo atenta. Hoje quando percebi já era dia, e qual não foi meu espanto, espremi meus olhos e abri novamente com força, fazendo uma careta abri bem a boca também, e não é que aquela luz pálida era do dia mesmo?! Então eu pensei se havia dormido ou não, e não é que tinha dormido mesmo?! Repousei novamente a cabeça no travesseiro, olhei as horas, constatei já ter dormido o suficiente.

Pouco mais tarde tentei te ligar, mas seu telefone se encontrava indisponível para mim. Meus olhos berraram praticamente incontroláveis a cada nova constatação, e eu poderia dizer que você já teve mais consideração ou urgência. O dia foi ficando cada vez mais dia, e quando refleti sobre aquela voz de máquina, cheguei praticamente a conclusão de que estava errada, mas tive medo de tentar mais uma vez e concluir qualquer outra loucura abstrata.

Quando finalmente obtive um tom mais longo, e ele consecutivamente sempre seguido de breve intervalo, em meio ao seu repetir obtive uma resposta diferente que foi, sem dúvida, a sua. Tivemos uma conversa brevemente longa e fomos interrompidos na quase conclusão, então trocamos mais umas palavras e voltamos cada um ao que já fazíamos, ou ao que já não fazíamos. O dia amanheceu sem que eu pudesse perceber, e foi ficado sempre mais dia, até que chegamos ao seu meio com um banho morno, e ultrapassamos ele com a sua sobremesa. E depois disso o dia foi ficando sempre menos dia. Mas também já nem sei se posso dizer que reparei nas variações do tom de branco ou de cinza que teve o dia. E também nem sei se já posso dizer que não é mais dia. Mas também nem sei se já posso dizer que acredito ou não, porque de repente esses detalhes já quase nem tem importância, pois simplesmente variamos.

O dia seguiu seu curso sempre mais veloz e logo em seguida mais lento. O dia seguiu seu caminho, que era o que ele desejava que fosse pois nós sabíamos apenas de uma coisa, para aonde vamos. E eu poderia dizer que quero sair exatamente agora, mas os traços ainda insistem em passar para o papel, e praticamente só me resta esperar a mão incessante que vai e vem preenchendo as lacunas. Que história se forma entre esses desenhos que chamamos de sues? Sim, porque eu quase poderia dizer que essas histórias se formam nos intervalos de suas linhas, que sua completude está no que seus desenhos não disseram e apenas deixaram que a história fosse. Porque assim é que as histórias vão se formando no intervalo de nossas imagens, no intervalo entre uma fala e outra, no intervalo entre um encontro e outro. Nossas história se formam por completo na suspensão de uma respiração e outra. E hoje espero ver sua história dar mais um passo, rumo àquela alegria que imagino para vocês.

Quase sempre dormi pouco se fosse dormir tarde demais. Quase sempre procurei algo para fazer no domingo as seis horas da manhã. Mas depois fui aprendendo a encontrar os motivos para acordar, mesmo que já fosse muito mais tarde. E depois percebi que as vontades simplesmente chegavam e nós íamos nos desdobrando atrás de cumpri-las. Qual era mesmo o nome daquele livro do qual não lembro quem foi autor? Ele contava uma história, qual mesmo? A nossa. Era um livro quase novo, mas foi envelhecendo assim como nós, e com o passar do tempo quase dei-lhe um nome, mas nomes pouco importam. Tem nomes que eu poderia esquecer, tem rostos que poderiam se apagar por completo, mas ainda poderia ouvir suas vozes, e depois de séculos eu ainda poderia lembrar de seus abraços. Porque não há corpo que eu tenha encontrado e que não tenha me abraçado, por que não há alma que tenha se imposto a mim e que eu não tenha sentido. Porque quase não há o que tenha sentido, ou que deixe de ter sentido.

Às vezes eu gostaria de poder deixar de dizer, mas ainda sinto mais vontade, então sempre deixo mais para amanhã.

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