quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Uma tecla e fico pendurada entre a indiferença e a aprovação. Seguro em um pedacinho de papel para voar quilômetros. Roubo a atenção que nunca tive, sem nunca ter o que mais quero. Uma fábrica, caixas de papelão sobre a esteira contínua. Para nascer uma coisa nova algo tem que morrer. Me apagar para comprovar a importância que eu não tenho, ou seria para esquecer a importância que tenho? Mas se é para esquecer o que sou, é porque tem menos valor ou porque de tanto valor que tem não precisa ser lembrado? Um recado perdido em um arquivo velho representa o que exatamente. Quando o mar recuou foi para voltar enorme e forte. Tentei me afogar para que não precisasse mais usar a tecla que me deleta, mas deixar de existir não é tão fácil assim. Ouvi um choro de criança sair de uma caixa, chorava de forma tão bela que resolvi não interromper seu lamento. Sentei em um banco de praça e comi sanduíche. Depois da chuva as árvores estavam mais verdes e o céu mais cinza. A água molhou os amantes, pensei em pegar o ônibus para Saturno. Mas o ponto final não costuma ser um ponto final.

Tinha uma represa, daquelas grandes e fortes, muito concreto, impermeável. Só que um dia surgiu uma rachadura, bem no meio. Bom, foi a partir desse dia que começou a vazar, no início parecia que o concreto tinha começado a suar, mas o negócio foi aumentando suas proporções. Todas as noites dormimos ouvindo os estalos sem nunca saber quando tudo viria abaixo. Não preciso falar do que se sente quando sabe que a qualquer instante você pode sufocar. De vítima e predador todos têm um pouco, não adianta ruminar as histórias que na realidade já acabaram. As aparências é que corroem o ser por dentro, ignorar os fatos prolonga a dor. Mas fugir do que pode vir a ser é como fazer um aborto antes da fecundação. Um dia inteiro para descobrir que ainda não acordei, e que a grande barreira de concreto ainda estala em meus ouvidos.

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