Daí
sinto aquele prazer crescente de quem logo vai explodir em uma nova
produção. Basta por hora tirarmos um pouquinho os pés do chão e olhando
para o teto pensar nos segundos que ainda não passamos, ou dos quais mal
podemos recordar. Mãos sobre o abdômem, uma respiração lenta e conto os
minutos para a hora de sair. Penso se deveria comer algo, beber um
pouco de água quem sabe. Juntamos as letras e formamos sequências sem
sentido. Coleciono várias horas perdidas, gastas de forma desordenada e
recolhidas em potinhos sem volta. Esqueço qual a sequência dos dias,
esqueço qual o nome das portas. Entro sem que elas tenham sido trancadas
e espio sempre que sou convidada. Construímos mundos inteiros em
segundos velozes, um ano em dois minutos, uma vida em uma noite.
Chorávamos abraçados em um tempo que não volta mais, o sofá continua com
o mesmo buraco. Lembro que segurava sua mão com a mesma força com a
qual pedia para que aqueles minutos se estendessem e para que aqueles
meses voassem.
A
vida escorre por entre os dedos, e quando acordamos já estamos enrugados
dentro da banheira. Construímos cuidadosamente nosso barco de papel,
esquecemos de desligar o chuveiro e a banheira transbordou. Agora
escorremos a toda velocidade pela correnteza. Em breves instantes
consigo tirar a cabeça da água e aspirar rapidamente. Volto ao mundo
turbulento de barulhos sem sentido, debatendo-me rolo por uma superfície
disforme.
Braços
ainda sobre o corpo, estico as pernas lentamente, vejo as estrelas
emitirem a luz que guardaram ao longo do dia. A luz se apaga lentamente,
e começam os sons da noite calma. Os raros automóveis passam cada um na
velocidade que escolhe. Escuto a conversa dos dois rapazes que voltam
para casa, as risadas da moça que ouve as novidades. Logo cedo a vizinha
ouve suas músicas preferidas antes de vestir o salto, dar algumas
voltas procurando as chaves do carro, conferindo os brincos, verificando
o batom e trocando mais uma vez o casaco, para ir trabalhar.
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