terça-feira, 6 de setembro de 2011

Enquanto vigio o teto

Daí sinto aquele prazer crescente de quem logo vai explodir em uma nova produção. Basta por hora tirarmos um pouquinho os pés do chão e olhando para o teto pensar nos segundos que ainda não passamos, ou dos quais mal podemos recordar. Mãos sobre o abdômem, uma respiração lenta e conto os minutos para a hora de sair. Penso se deveria comer algo, beber um pouco de água quem sabe. Juntamos as letras e formamos sequências sem sentido. Coleciono várias horas perdidas, gastas de forma desordenada e recolhidas em potinhos sem volta. Esqueço qual a sequência dos dias, esqueço qual o nome das portas. Entro sem que elas tenham sido trancadas e espio sempre que sou convidada. Construímos mundos inteiros em segundos velozes, um ano em dois minutos, uma vida em uma noite. Chorávamos abraçados em um tempo que não volta mais, o sofá continua com o mesmo buraco. Lembro que segurava sua mão com a mesma força com a qual pedia para que aqueles minutos se estendessem e para que aqueles meses voassem.

A vida escorre por entre os dedos, e quando acordamos já estamos enrugados dentro da banheira. Construímos cuidadosamente nosso barco de papel, esquecemos de desligar o chuveiro e a banheira transbordou. Agora escorremos a toda velocidade pela correnteza. Em breves instantes consigo tirar a cabeça da água e aspirar rapidamente. Volto ao mundo turbulento de barulhos sem sentido, debatendo-me rolo por uma superfície disforme. 

Braços ainda sobre o corpo, estico as pernas lentamente, vejo as estrelas emitirem a luz que guardaram ao longo do dia. A luz se apaga lentamente, e começam os sons da noite calma. Os raros automóveis passam cada um na velocidade que escolhe. Escuto a conversa dos dois rapazes que voltam para casa, as risadas da moça que ouve as novidades. Logo cedo a vizinha ouve suas músicas preferidas antes de vestir o salto, dar algumas voltas procurando as chaves do carro, conferindo os brincos, verificando o batom e trocando mais uma vez o casaco, para ir trabalhar.

Eu fecho os olhos e deixo que ele me observe de volta. Suspiro e deixo que suas gotinhas me olhem com ternura. Observamo-nos por horas, nos prolongamos nesse dialogo mudo. Sempre ele esteve a me cobrir, sempre ele a me vigiar. Durmo por horas, e quando acordo descubro que passaram-se minutos.

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