quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Para quando a chuva chegar


A chuva escorre pela vidraça, escuto em silêncio suas gotas esparsas atingirem os telhados. Cubro os tornozelos com a coberta de lã, espero pela mudança de temperatura que se anuncia lentamente. O sol raiou por tempo suficiente para secar minhas roupas. Inclinei-me ao tanque por tempo bastante e quando o telefone tocou descobri que já era hora de almoçar. Um copo quebrado, alguns minutos de atraso. A chuva escorre e nós já esperávamos por ela.

Durante o dia deixei que ela tomasse sol, depositei-a cuidadosamente no peitoril da janela, ela sacolejou alegremente com o vento morno que vinha lá de fora. As cortinas brancas se agitaram e derrubaram alguns objetos sem importância. Seu banho de sol foi proveitoso, assim espero. Ela absorveu a luz necessária para enfrentar os próximos dias nublados, espero que seja o suficiente para suportar alguns dias dentro da gaveta. Pego então uma caixinha de madeira acolchoada, tecido colorido, bordado. 

Os dedos se espalham alegremente por aqui e por ali, compõem essas histórias contadas com borrões e intervalos. Criamos uma cantiga que diz verdades doces em tardes de verão. Hoje durante o dia sentimos o ar morno, acordamos com a carícia do sol do outro lado da persiana, e pensamos no tempo para o nosso feriado. Sempre que saímos de feiras compramos um pacote de jujubas, enchemos garrafas de água, e carregamos algumas maçãs e guardanapos. Viajamos olhando a paisagem, fechando os olhos e sentindo o balanço. Gostamos principalmente de sentir a brisa.

Roupas na mala florida, um lenço no pescoço, chapéu na cabeça. Vestimos botas de cano alto para proteger os tornozelos, ordem do professor. Quando chove uso capa de chuva, visto uma touca, e abro meu guarda-chuva da estação passada. Lembro do meu último guarda-chuva, tantas chuvas guardou. Presente de aniversário das minhas avó e bisavó. Era uma sombrinha dessas pequenas que podemos carregar na bolsa, e eu carreguei. Pegamos chuvas das mais variadas, até que ela adquiriu uma goteira e em uma ventania quebrou uma das astes. Com o passar do tempo tive de substituí-la, pois sombrinha de montar e com goteira dá trabalho. 

Gosto de bolinho de chuva, principalmente na casa dos amigos. Gosto de bolinho de chuva com chá de hortelã, gosto de bolinho de chuva com açúcar e canela. Gosto de bolinho de chuva com tinta e pincel, com papel e lápis, com filme e mate doce. Gosto de fazer maria-mole e ver os outros comendo, mas não gosto do barulho que ela faz para ficar pronta. Gosto de ver o coco ralado caindo feito chuva, mas chuva caindo feito coco ralado é neve. Visto botas de cano alto e capa de chuva. Visto touca para não molhar os cabelos no banho. Uso toalha para secar o rosto, e uso varal para secar a toalha.

A chuva escorre pela vidraça e eu penso que não preciso estar lá fora, que aqui dentro é quentinho e seco, que aqui dentro é quentinho e iluminado. Eu escuto a chuva, e sei que a noite se espalha lá fora. Eu escuto a chuva e escuto o barulho dela no asfalto. Eu escuto a chuva e lembro do telhado de zinco, escuto a chuva e lembro do temporal. Escuto as gotas esparsas caindo aqui e ali, escuto as gostas gordas fazerem taque quando batem. Eu sei do leite que fica quentinho quentinho, e com uma colher de mel, não preciso de remédios para dormir.

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