quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Porque duvidar é muito pouco

Esquecer, porque lembrar é muito pouco.

Dormir, porque esperar é muito pouco.

Desaparecer, porque existir é muito pouco.

Partir, porque desistir é muito pouco.

Mudar de direção várias vezes, porque apenas um caminho é muito pouco. Desesperar-se no meio da estrada porque nunca soube para onde ir. Sentar sobre os joelhos com as mãos em concha sobre o colo como quem espera as migalhas caírem do céu. Despencar, porque viver pendurado é muito pouco.

Mergulho sempre mais, até que a luz fique pouca, e nem sempre sabemos voltar, e quando voltamos nem sempre lembramos onde estivemos. Deitar na cama macia, porque o calor é muito pouco. E acordar várias vezes ao dia como quem se recupera daquela profundeza. Criar uma nova rotina, planejar uma nova vida. Prosseguir, porque sempre é muito pouco.

Olhamos um texto pronto e descobrimos que estava inacabado, olhamos um texto inacabado e descobrimos que estava pronto. Faço uma pausa, porque continuar é muito pouco. Largo da barra da tua saia, porque aguentar é muito pouco. Vivemos de uma nova forma, porque manter é muito pouco.

Invento o tempo, invento nossas meias sujas sobre o tapete. Tampo o nariz e a boca enquanto olho pela janela. Imagino o nado sincronizado, porque tenho medo de sufocar. Suponho, crio várias hipóteses, porque preciso estar sempre prevenida. Mas então abro os braços e me jogo da janela. Mergulho, porque observar é muito pouco.  Ferir-se, porque planejar é muito pouco.

Tampa o sangue que verte do nariz, debulha o milho que distribui para as galinhas. Canta pequenos trechos de cantigas desordenadas que guardou na infância. Assoa o nariz na manga da camisa e inventa seu próprio ditado popular, porque repetir apenas é muito pouco. Criar regras próprias, porque respeitar apenas é muito pouco.

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