quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Sobre um fim

Meu caderninho acabou, preenchi até seu último espaço vazio e não tenho dinheiro para comprar um novo. Nesse caso acho que devo usar as páginas virtuais mesmo. Os caderninhos, quantos eles são ao todo? Perdi a conta, talvez sejam quatro. Por vezes corro sobre suas folhas com maior velocidade, às vezes mais lentamente. A verdade é que os ocupo sem uma regra preestabelecida. Por quanto tempo me perco entre suas folhas contando as novidades do tempo, e quem mais me aguentaria por tanto tempo? Sim me suporto por anos, me aceito consecutivamente e vou aprendendo a deixar as discussões para quando a festa acabar. Mas repentinamente me debato nessa muralha sem escadas. Lembro-me do velho que desejava fugir da própria casa. Quanta loucura em cada degrau. Jogue suas tranças. Enquanto me debato nesse espaço turbulento a carcaça para a qual olham fica estática e olha sem vida para o nada. É normal que perguntem o que houve, os veteranos já evitam contato. 

Tudo é na verdade muito simples, tão simples que demoramos anos tentando entender, e ainda assim ficamos um pouco em dúvida. O que dizem parece tão real, mas cada velha imagem guardada faz retomar uma dor. Os curativos são bonitinhos e decorados, mas as feridas que eles cobrem em sua maioria ainda sangram.

Meu caderninho acabou, liguei para pedir um novo, mas o telefone não atende, eu mesma não tenho dinheiro. Pensei em um caderno que eu mesma fiz, mas ele é muito grande, não seria um caderninho. De qualquer forma esses cadernos devem ser pequenos e rápidos de usar, não devem durar mais do que oito meses. Eles guardam muitas coisas e se tornam pesados, por isso devem durar pouco. Sinto falta dos dias em que escrevíamos compulsivamente sentadas à mesa de vidro. Isso geralmente quando eu podia ficar completamente só, e sabia que ninguém aguardava por mim, na verdade acreditava que não se importavam.

As pessoas falam coisas estranhas, parecem nem ser as mesmas que um dia vimos. O mundo alheio é sempre muito estranho se não vivemos de forma semelhante. Às vezes há coisas que podemos entender, outras vezes as coisas são muito difíceis de aceitar. Eu hoje tento compreender certos passos meus ou seus, tento deduzir, e de repente tenho a brilhante ideia de simplesmente perguntar. Talvez fosse algo como ler o livro da própria vida escrito por outra pessoa. Era isso que eu pretendia, você pode falar como  vê a nossa vida? Geralmente nos surpreendemos. As surpresas costumam ser boas, ou esclarecedoras, isso quando não são as duas coisas juntas.

Meu caderninho acabou e agora preciso de um novo. As lojas já fecharam, eu não gostaria de ganhar como um presente, a menos que você me permita escolher. Preciso de folhas novas, preciso de um caderno novo, com espaço para ser ocupado. Esses cadernos sempre pesam depois de um tempo, por isso não podem se prolongar muito. O primeiro deles foi o mais diferente, acho que ainda não havíamos definido nossos procedimentos, e até hoje tentamos reorganizar. A verdade é que não adianta. Eles tomam a forma que bem entendem e eu que corra atrás. Nossa ordem foi definida ao acaso e nos reorganizamos a cada temporada. Os projetos se espalham por essas peças separadas, e quem sabe uma hora ou outra tomemos coragem para realizar alguns deles.

Você me fala como será amanhã, e eu ainda nem entendo o que temos hoje. Os dias se espalham por camadas disformes, subimos e descemos em busca dessa liga. Esqueço a janta, preciso de um caderninho novo.

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